Roger Machado entre a evolução e a impaciência

Matheus Eduardo
6 min readApr 21, 2017

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Desde o título da Copa do Brasil de 2014, o Atlético Mineiro tem sofrido muito com a escolha de seus treinadores e, principalmente, com o trabalho deles dentro do clube. De lá para cá, três técnicos diferentes passaram pela Cidade do Galo, e nenhum deles acumulou muitos elogios por parte da torcida e da opinião pública.

No fim do ano passado, foi identificado um grande problema nas últimas equipes atleticanas: a falta de equilíbrio em seus setores. Com Levir Culpi — meio de 2014 até o fim de 2015 -, um time ofensivo demais e que, em contrapartida, abria muitos espaços e deixava os contra-ataques dos rivais muito viáveis, expondo seus defensores ao máximo e induzindo-os a erros individuais. Com Marcelo Oliveira — segundo semestre de 2016 -, um time ainda mais aberto defensivamente, com movimentos aleatórios e pouca construção no meio-campo, mas com atacantes de qualidade individual suficiente para produzir muitos gols e tentar descomplicar a situação.

Já Diego Aguirre — primeiro semestre de 2016 -, na contramão dos dois anteriormente citados, tentou levar ao time o equilíbrio que faltava entre atacar e defender, mas pecou em alguns aspectos importantes. Tendo como principais características a defesa firme e o jogo mais reativo, fechando linhas e esperando o adversário para contra-atacar, o uruguaio esbarrou em um time de filosofia ofensiva e jogo agressivo no campo de ataque, e não conseguiu mesclar essas ideias. Durou pouco mais de 4 meses em Belo Horizonte, e, após sua demissão, todo o dilema tático se agravou na Cidade do Galo.

O porquê de citar os técnicos anteriores até chegar em Roger Machado é bem simples, apesar dos parágrafos mais complexos antes. O ex-Grêmio levou para o Atlético o que faltou em todos os comandantes anteriores. Trouxe o que o time precisa, as ideias necessárias para tornar o Galo competitivo, e tenta, ao máximo, colocar isso dentro do campo. Porém, nem sempre teoria e prática são compatíveis, e o atual comandante percebe o quanto isso afeta o seu trabalho nos primeiros meses do ano.

Roger Machado já é muito cobrado pela torcida devido aos resultados ruins neste início de trabalho (Foto: Bruno Cantini/Atlético Mineiro)

Mesmo tendo quase quatro meses de trabalho, Roger ainda não conseguiu encontrar um time-base para trabalhar: problemas físicos e de adaptação nos esquemas táticos e nos planos de jogo, perdas inestimáveis no elenco, além de características divergentes de seus atletas aos diferentes esquemas de jogo, fizeram com que o planejamento estagnasse. Ao menos até aqui. E, além desses fatores, está a incessante cobrança da torcida, já que, apesar de ter boas ideias, um treinador precisa de bons resultados para sobreviver no cargo. E, em 2017, o Atlético mostrou desempenho muito aquém do esperado em todas as partidas de maior exigência.

Apesar de tudo, dá para dizer que a equipe passava por um processo evolutivo, barrado pela incompatibilidade dos jogadores ao sistema de jogo. Durante a temporada, o time variou entre dois esquemas táticos desde que o elenco esteve com quase todas as opções à disposição. Primeiro, o 4–1–4–1, tendo Rafael Carioca como o “regista”, meio-campista entre as duas linhas, fazendo a saída de bola e ligando setores do campo. Não deu certo, já que o jogador quase não conseguiu dar verticalidade alguma ao jogo. Além disso, Robinho, inicialmente ponta esquerdo, não fazia a função durante os 90 minutos pelo desgaste físico que causava a ele, e acabou desequilibrando o esquema ao deslocar Cazares para o lado de campo. O sistema, porém, era excelente para aproximar os jogadores e infiltrar os meio-campistas. Em especial, Elias, que aproveitou bem essa gestão dos espaços e fez suas melhores partidas pelo Atlético neste esquema.

4–1–4–1 usado por Roger Machado durante parte do Campeonato Mineiro: Cazares abrindo e Robinho centralizando em muitos momentos mudava o sistema; Otero e Rocha invertiam funções em partes do jogo e Elias infiltrava com mais facilidade. Rafael Carioca era o homem entre as linhas e iniciava as jogadas

Em mais uma tentativa de adaptar Robinho ao time, Roger Machado optou pelo 4–2–3–1/4–4–2 em jogos maiores. Não deu certo. Primeiro, porque a equipe perdeu profundidade na hora de atacar e não soube ocupar o campo de ataque nos momentos ofensivos: propôs mal o jogo, sem conseguir ter a bola por muito tempo e, de quebra, com os volantes Rafael Carioca e Elias totalmente mal adaptados à função, sofreu muito para brecar os ataques adversários. Assim, mesmo tendo Robinho e até mesmo um dos pontas entrando para armar em momentos curtos do jogo, pouco fez, porque faltava o jogador para atuar por dentro constantemente e fazer essa armação das jogadas — Cazares acabou fadado a jogar pelas pontas, especialmente na esquerda.

4–2–3–1/4–4–2 do time atual: Robinho à frente das duas linhas e, em momentos, recuando para buscar a bola; Cazares (ou alternativas) à esquerda e a mesma alternância entre Marcos Rocha e Otero; meio-campistas, Carioca e Elias mais contidos neste sistema: mais dificuldade na movimentação do primeiro e nas infiltrações do segundo

Isso também explica a vulnerabilidade defensiva atleticana nos últimos jogos, com uma última linha falha — Leonardo Silva sofre na velocidade e no mano a mano, especialmente pela lentidão em cobrir espaços, já em idade avançada — e o lado esquerdo enfraquecido, pelo momento ruim de Fábio Santos. E, com o coletivo rendendo abaixo, a falta de confiança respinga no rendimento: Giovanni falha em um jogo, Gabriel em outro, Otero e Cazares produzem pouco em detrimento do fraco coletivo criando jogo, e por aí vai. Uma coisa acarreta outra.

E, além de tudo, um grande problema alvinegro neste ano: tentar adaptar os jogadores mais “consagrados” no time titular. O maior exemplo é Robinho, artilheiro do time no último ano, mas que não se encaixou em nenhuma das posições em que foi colocado: sem velocidade e vigor físico para atuar na esquerda — onde gosta -, acabou deslocado para o centro de campo — posição naturalmente dominada por Cazares -, e não rendeu nada, já que arma as jogadas com menos qualidade e, para fazer o time ir para frente, no jogo vertical, contribui pouco.

Roger Machado e Robinho: treinador tem feito de tudo para encaixar o ex-atacante da seleção brasileira em seu time, mas o resultado não se mostra muito positivo (Foto: Bruno Cantini/Atlético Mineiro)

Em meio a tantas críticas, porém, nada justifica pedir a demissão de Roger Machado agora, com menos de meio ano de trabalho. A temporada ainda está em sua parte inicial, com campeonato estadual (que não é o maior parâmetro para julgar o desempenho de todo o ano de um time) e primeira fase de Libertadores/Primeira Liga disputados, com poucos jogos contra equipes mais fortes e qualificadas. Além disso, o auge físico e técnico das equipes se dá com o tempo, ainda mais quando o treinador é recém-chegado. Mas, quando mal dá tempo para isso acontecer, fica impossível cobrar tanto.

Mais do que tudo isso, o principal: o treinador está tentando muito, e já trouxe alguns resultados. Em poucas semanas, corrigiu o PROBLEMA SÉRIO de compactação das linhas de marcação que o time montava quando perdia a bola, e busca, cada vez mais, o tão necessário equilíbrio entre os setores ofensivo e defensivo do time. Em todos os jogos, a equipe se posiciona de maneira coesa quando está se defendendo, protege o espaço, e tenta jogar, com a bola nos pés, de maneira uniforme. Falta velocidade, intensidade e verticalidade para entrar com a bola no campo adversário e qualidade para concluir? Claro que sim. Mas, antes de tudo, é importante perceber que alguns passos já foram dados, e é necessário dar o respaldo para que Roger consiga consertar o que não está funcionando. Só assim, ele poderá consertar os problemas das as peças que não se encaixam no sistema de jogo, e tornar a equipe mais competitiva.

Para concluir o texto, uma pergunta: quantas vezes você já pediu ou viu alguém pedindo a saída de um treinador de uma equipe? Em quantas delas ocorreu essa troca, e ela NÃO deu certo? Se aconteceu em um número considerável de vezes, repense. Será que o treinador é mesmo o problema quando o trabalho traz alguns bons sinais? Nada feito de maneira pouco pensada traz bons frutos. E a expectativa é que o Atlético realmente tenha aprendido com os erros e percebido isso. Tomara que Roger não seja mais um a se tornar, precipitadamente, vítima deste desmanche dos treinadores na Cidade do Galo.

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Matheus Eduardo

Raramente (mas não nunca) posto algumas ideias aqui. A intenção é fazer essas leituras valerem a pena. Futebol em todos os sentidos possíveis.